quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Canais de Santos — Documentário fala sobre a história da reurbanização de Santos através do projeto de Saturnino de Brito.

Por Stephanie Monteiro
e Ana Luiza Roma Couto Serra

Quando um santista fala onde mora na cidade, não se refere ao nome da rua, da avenida ou do bairro — localiza-se, peculiarmente, por meio dos canais. É fácil vê-lo e ouvi-lo dizer que vive no canal um, ou dois, ou três, ou sete... Mas muitos santistas desconhecem sua real função e a mente que planejou toda a estrutura de saneamento de Santos: o engenheiro Saturnino de Brito. O documentário Os Canais de Saturnino, dirigido por Carlos Oliveira procura mostrar toda a importância desse engenheiro sanitarista para o processo de saneamento do município de Santos em fins do século XIX e início do século XX.


A entrevista que Carlos nos concedeu na sede do CBRN – Santos desvela um pouco do processo para a criação deste audiovisual, além de informar acerca deste formato tão interessante e revelador que é o documentário.


Entrevista — Carlos Oliveira


Carlos Oliveira e parte da equipe de Os Canais de Saturnino


Ecoblógico: O que o motivou a realizar este documentário sobre o trabalho do Eng. Saturnino de Brito?

Carlos: A idéia partiu da diretoria da Fundação Arquivo e Memória de Santos, que desejava iniciar a produção de documentários baseados em seu material de acervo. A Fundação possui cerca de 20 exposições fotográficas temáticas, sendo que uma delas, justamente sobre os canais, serviu como principal base iconográfica para o documentário. A oportunidade veio ao encontro de um desejo meu: produzir documentários sobre a história da cidade, um sonho que venho alimentando desde que comecei a trabalhar com audiovisual – há 15 anos. Admiro muito a história de Santos e região, pois foi aqui que o Brasil nasceu economicamente, através da tentativa da implantação da cultura da cana-de-açúcar. É fascinante pesquisar desde a chegada dos portugueses no século XVI até a expansão da cidade, no início do século XX. Eu, a Madeleine Alves e a Tatiana Santi nos esmeramos na pesquisa histórica, que foi a base para a elaboração do roteiro. Eu queria um filme que não falasse dos fatos históricos simplesmente, mas que contasse a história cronologicamente, com uma preocupação didática, já que muitos santistas desconhecem passagens importantes da história da própria cidade. Essa também era uma preocupação do diretor da Fundação, Eng. José Manuel Costa Alves, que considera o filme um material de apoio às aulas de História.

Eco: Em sua opinião, qual a relevância do trabalho do Eng. Saturnino de Brito para Santos?

Carlos: A obra de Saturnino em Santos foi fundamental para sanar problemas de saúde que se agravavam e para permitir o crescimento da cidade em todos os sentidos. Sem saúde, não haveria mão-de-obra para a lavoura de café, nem para o porto. Não haveria desenvolvimento da cidade e isso prejudicaria o desenvolvimento do país. Como engenheiro-chefe da Comissão de Saneamento de Santos, uma repartição estadual na época, Saturnino projetou o sistema de esgotos e a rede de canais pluviais – dois sistemas sem ligações entre si. Essas obras permitiram a extinção dos focos de várias epidemias que já se alastravam pelo interior do Estado, além de propiciar o enxugamento, em aproximadamente vinte anos, dos terrenos dos bairros em formação. A drenagem do solo, que possibilitou a ampliação da área urbana de Santos até a Ponta da Praia, é função dos canais até hoje. Então, foi relevante não somente para Santos, mas para o Estado de São Paulo e para o Brasil, pois Santos era e ainda é o principal porto de exportação do País. Saturnino também atuou em mais de quarenta cidades brasileiras e ainda projetou um admirável plano urbanístico para o crescimento de Santos, que infelizmente foi mais ou menos seguido, devido à sua não aceitação pela Câmara Municipal e os proprietários de terras. Saturnino foi um homem com uma visão nobre de futuro.

Eco: Por que o documentário se presta melhor a contar fatos históricos?





Carlos: Eu não diria que é o melhor formato para isso. Podemos mostrar fatos históricos e até contar uma história real dentro de uma moldura de ficção, por exemplo. Depende da proposta de criação. Ficção e documentário são dois conceitos opostos, mas, como formatos, eles não estão totalmente isolados um do outro. Ao classificarmos os filmes, notamos gradações que vão do puro documentário até a pura ficção. O documentário e a ficção contribuem para o conhecimento da realidade, mas o documentário busca esse conhecimento como objetivo essencial, porque ele aborda a realidade através da existência de seus elementos concretos. O documentário é um dos meios de registro, estudo e divulgação da história, porque ele geralmente usa uma forma de produção que se assemelha ou que, em certos casos, até se equipara à investigação científica. Pode ser destinado, em especial, a determinado público-alvo, possuindo uma linguagem adequada a esse público, como, por exemplo, o caso dos documentários científicos. 

Eco: Quais são as suas expectativas quanto à carreira e a repercussão deste documentário?

Carlos: Eu trabalhei por mais de dez anos com audiovisual, em produção de vídeos de eventos e em televisão, mas somente há dois anos resolvi produzir cinema. O meu maior investimento em formação profissional foi nessa área e não via a hora de produzir algo. Agora estou para lançar o meu terceiro curta-metragem como diretor. Penso em realizar muitos curtas-metragens antes de encarar um projeto de longa. É preciso antes adquirir muita segurança e estar mais ou menos firmado como diretor de curtas. Eu quero experimentar muito ainda, até encontrar um estilo próprio. Quanto a Os Canais de Saturnino, já foram realizadas algumas exibições públicas e o DVD do filme foi distribuído nas escolas municipais. Tenho recebido um bom feedback. O filme está abrindo caminho para a produção de novos documentários sobre temas da história da cidade de Santos. Pretendo produzir um segundo documentário já no ano que vem. Temos, aqui, muita história para contar e lembrar.



Eco: Quais são as oportunidades para viabilizar um documentário como este?


Carlos: Quando a verba do realizador é insuficiente ou inexistente para a produção, é preciso buscar um patrocinador que aceite patrocinar em troca da divulgação de sua marca ou da participação no lucro da comercialização da obra. Conseguir um patrocinador nessas condições é quase um ato heróico porque o retorno para o patrocinador poderá, em muitos casos, não corresponder às expectativas. Então, a maioria dos realizadores já procura os mecanismos de apoio criados por leis em níveis federal, estadual e/ou municipal (em 20 estados e 11 capitais brasileiras, de acordo com o Guia Kinoforum). São os concursos para seleção/ premiação de projetos e os programas de incentivo fiscal. Para o nosso documentário, recebemos uma verba da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Montei uma equipe de produção junto à Phanton Comunicação, através da qual contei com excelentes profissionais. Entretanto, a realização do filme precisou contar com o apoio de outras instituições: A Prefeitura ajudou com o transporte da equipe. A Secretaria de Comunicação cedeu imagens de arquivo aéreas da cidade, em vídeo. A Secretaria de Planejamento cedeu ortofotos da cidade. A Beneficência Portuguesa cedeu salas com mobiliário para gravações internas, a Sabesp cedeu ambientes internos com mobiliário que pertenceu ao Saturnino, fotos, plantas e mapas. O Centro de Documentação do Museu do Café cedeu fotografias de ferrovias e lavoura de café. A Monte Serrat cedeu acesso ao mirante do cassino para gravações de panorâmicas da cidade. A Pinacoteca Benedicto Calixto cedeu foto-reproduções de telas. O Antiquário Castelinho cedeu o figurino completo para o ator Alex Cruz, que interpretou Saturnino.



Eco: Em um país onde o saneamento é tão precário, o que você espera contribuir para que ações sejam efetivadas nesta área?


Carlos: Desejo continuar produzindo documentários informativos e educativos, contribuindo para enriquecer o material de apoio ao ensino. Espero que o nosso trabalho estimule a curiosidade do aluno, do pesquisador e do cidadão em entender melhor o processo histórico em que estão inseridos.  Quero fazer um cinema que não seja só entretenimento. Quero projetar conhecimento, cultura e valores de cidadania. Acho que a relação do cinema com a educação dá um bom casamento.


Colaboração:
Aécio Moraes e Madeleine Alves




Contatos: 
Stephanie Monteiro: stephanie@ambiente.sp.gov.br
Ana Luiza Roma Couto Serra: analuizar@ambiente.sp.gov.br
Carlos Oliveira: spectrafilmes@hotmail.com



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